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O ser humano tem uma necessidade social de pertencer a grupos nos quais tenha participação ativa, contribuindo com tempo, serviço ou dons. Essa necessidade atinge a todos, sem excessão, e quando realizada, traz satisfação, prazer, orgulho, elevando-nos a autoestima somente pertencermos à esse grupo.
Ser ou estar incluso socialmente é um grande benefício, mas nem todos podem ter esse prazer realizado.
Por quê? De que depende?
Da aceitação de quem e de como você é! Pois aí mora o segredo da Musicoterapia. Aceitar a pessoa exatamente como ela é, e estimular para que desabroche de dentro dela o melhor que ela puder ser e esse melhor, seja o que for, apenas um sorriso ou um balbucio, deixe felizes e realizados os dois lados: o professor e o aluno, o musicoterapeuta e o paciente.
- 2004. Ela chegou para participar do nosso grupo “Trabalhando o Futuro” da equipe da professora Daise A. Silva, com alunos da AACD, no colo da mãe, loirinha de cabelos lisos corte chanel, óculos de 16 graus, com um lindo e meigo sorriso, 7 anos de idade.
Paralisia Cerebral com atraso mental de 4 anos! Fala pouco, movimenta menos ainda, mas quer fazer.
Bem, e aí, fazer o quê?
Checo sem constrangimento:
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1. Anda? Não.
2. Fala? Sim, mas podemos aumentar o vocabulário e melhorar a entonacão com o trabalho. A música é um veículo expressivo para o alívio da tensão emocional, superando dificuldades de fala e de linguagem. A musicoterapia é usada para melhorar a coordenação motora nos casos de paralisia cerebral e distrofia muscular, assim como para ensinar controle de respiração e da dicção nos casos em que existe distúrbio da fala.
3. Consegue manter-se sentada em equilíbrio? Sim!
4. Lado melhor: esquerdo. Esquerdo? Nem parece, pois a limitação é grande.
5. Consegue articular os dedos das mãos? Não. Só o polegar e o indicador da direita e o indicador da esquerda.
6. Consegue levantar os braços? Com dificuldade. E a cada resposta vejo limitarem-se as opções.
Então começo pensando: são duas as opções
- 1) o que ela gostaria de fazer?
- 2) E o que dá para começar a desenvolver?
Pergunto:
- Vamos cantar?
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Relembro:
1. Cantar é uma atividade que exige controle e uso total da respiração “O canto desenvolve a respiração, aumenta a proporção de oxigênio que rega o cérebro e, portanto, modifica a consciência do emissor”. “Cantar pode ser um excelente companheiro de aprendizagem, contribui com a socialização, na aprendizagem de conceitos e descoberta do mundo. Cantar pode ser um veículo de compreensão, memorização ou expressão das emoções”.
2. "O canto também pode ser utilizado como instrumento para pessoas aprenderem a lidar com a agressividade. Estou convencida! É por aqui que vamos começar.
Relaxamento-respiração- emissão-relaxamento.
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1. “O relaxamento propicia o controle da mente e o uso da imaginação, dá descanso, ensina a eliminar as tensões e leva à expansão dos nossos horizontes
2. “Ele depende da concentração e por isso só já possui um grande alcance na educação de crianças dispersivas, na reeducação de crianças ditas hiperativas e na terapia de pessoas ansiosas ”.
3. Crianças com problemas de adaptação geralmente apresentam respiração curta e pela boca, dificultando a concentração (controle respiratório).
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Preparo com cuidado os exercícios;
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Posição: Postura correta na cadeira – peito para fora, barriguinha para dentro.
Relaxamento: Cabeça tombada para frente, (olhando pra o peito) para trás, (olhando para o teto) lado esquerdo, lado direito. Movimentos giratórios do pescoço em torno da cabeça, bem lentamente, começando pela direita, depois pela esquerda. (Vamos fazer o trabalho do ponteiro do relógio dando a volta completa?)
Respiração: Inspiração – Vamos cheirar bem forte o perfume da flor?
Expiração: Vamos usar o ar para apagar a vela?
Peça: E lá vamos nós com músicas da faixa etária, com exercícios fáceis tanto para a faixa etária quanto para as
dificuldades existentes. Agora, vem a escolha da peça com frases simples, letra fácil, só com figuras 4 e 8. “Frere Jacques” com letra adaptada:
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Os Gatinhos (Uso cartazes com figuras relativas à letra). Letra fácil, apelo bom para a idade.
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Começamos num andamento e terminamos mais lento, começando em uma intensidade média e terminamos em uma mais fraca. Trabalhamos diminutivos, expressão e a entonação: Os gatinhos’
Bonitinhos’
Ao dormir’
Ao dormir’
Fazem de mansinho’
Bem devagarzinho’
Rom, rom, rom’
Rom, rom, rom’
E ela gosta. E eu fico satisfeita. E começo a fazer um cânone com ela. E fica bonito. E ela fica feliz. E eu realizada! E começo a acompanhar ao Piano. De repente, Débora diz:
“Eu quero tocar! Posso?” Pooode!
E com o dedo indicador da mão direita, só com o indicador retesado, fazendo um super-esforço para manter o braço na altura correta, começa a dedilhar a melodia.
E gosta do que ouve. Quer mais. Ofereço com cuidado: “Quer conhecer as notinhas?”
A partir daí, começa a conhecer as notinhas comparadas com figuras, depois vou esquecendo de colocar a figura em algumas, começa a escrever o nome de cada notinha, e entoa a notinha e
começa a sua afinação por comparação na tecla, depois memorizada.
E canta primeiro até saber, depois com o nome das notas e então fazendo o pulso com palmas, depois toca com o indicador.
E escreve e lê!
“Tia, posso tocar com as duas mãos?” Ah, meu Deus!
Vamos ver, penso, será que podemos usar o dedo indicador da esquerda, com o sistema One Finger do teclado? E com esforço novamente começamos o exercício de levantamento de braço, agora o esquerdo. E dá certo. Por isso, pode aprender as cifras. E toca. E comeca a participar dos grupos e é querida, pois sabe tocar e é alegre, participa ativamente.
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2008
Ao participar do evento do Conselho Estadual para Assuntos da Pessoa Portadora de Deficiência -
Viva a Diferença: PORQUE PARA SER BELA - NÃO PRECISA SER IGUAL,
escolhemos Débora para se apresentar e ela foi!
Débora Samaro com Brenda Costa, modelo internacional, deficiente auditiva.
Sidney A. Joly, plant manager da Furukawa, Mauro F. Nascimento, Débora já na cadeira nova e prof Daise, na sede da Daise Publicações Ltda.
Aprendendo a ler as sílabas
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Pronunciando a 1ª palavra!
Uma das regras da educação é que o aluno tenha “autoestima, autoconfiança”. Vamos lá:
Autoestima é gostar de quem somos.
Autoconfiança é saber que podemos realizar.
Aí começa todo o problema: De onde vem essa autoestima? De fora para dentro, alimenta-se e cresce com o amor que vem de fora para dentro.
“Nisso, chega o menininho assustado, mostrando os recém nascidos dentes permanentes, sem condição de andar, não fala também. Todos o olham como se dissessem: “Chegou o diferente” e ele sente, ele entende os olhares. E se fecha em si mesmo. Apaga o sorriso.
Emburra. Tudo o que diz é: não com a cabeça!
Autoestima? Como, se não tem
nem estima? Autoconfiança, se
sabe que não consegue ? Tem
microcefalia. Não fala, emite
ruídos.
Tenho a impressão que
também não entende.
Começamos a cantar e noto que
olha muito para um quadro na
parede com um maestro
regendo. Não tira o olho de lá.
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Sem dizer uma palavra, dou a batuta para ele. Pronto! Parece que deram corda na criança e ela mostra o vislumbre de um sorriso no olho. Ele começa a agitar a batuta para baixo e para cima, com força.
Faz um tremendo esforço para conseguir esse movimento. Está participando. Quando a música termina, eu aplaudo e os outros me seguem. Ele sorri. Continuamos, eu pegando em sua mãozinha sem controle, e juntos fazemos o pulso sempre com a batuta, para baixo e para cima, junto comigo, segurando ferrenhamente a batuta.
Sorri sempre para o Luiz, meu marido. Pego sua mãozinha e faço um movimento: um arco para cima e pronuncio um U bem comprido, aí descemos a mão reta, como se fizéssemos o número 1 e pronuncio Izzz bem longo. UUUUUU-Izzzzzz.
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UUUUUUUUIIIIIZZZZZzzzzzzz
Todos repetem comigo, ele olha bem fixo. Na outra aula, sobe a mãozinha magra e pronuncia:
UUUUUUUUIIIIIZZZZZzzzzzzz
UUUUU, desce a mão, abaixa o tom Izzzzz sibilando!
Aplaudimos.
Ele sabe que acertou.
Já é parte da turma. Procura a batuta e começamos a cantar.